sexta-feira, 2 de maio de 2008

O Homem e o Vício


Para uma espécie equipada para sobreviver, temos o estranho hábito de nos tornarmos dependentes de coisas que podem matar-nos. Novos estudos revelam porquê, e abrem a porta à cura.
Dispondo de um conjunto cada vez mais sofisticado de tecnologias, incluindo visualizações por fMRI (Ressonância Magnética funcional) e PET (tomografia por emissão de positrões, os investigadores começaram a descobrir o que corre mal num cérebro de um dependente – os neurotransmissores que estão desequilibrados e as regiões do cérebro afectadas. Com esse conhecimento, começaram a conceber novos medicamentos que se mostram capazes de eliminar a ansiedade que arrasta o dependente para um recaída.
“As dependências são comportamentos repetitivos perante consequências negativas, o desejo de continuar alguma coisa que sabemos ser má para nós”, afirma Joseph Franscella, director da divisão de neurociências clínicas do Instituto Nacional de abuso de Drogas (NIDA).
Então, porque razão a evolução não as extirpou das pessoas? Se já é difícil conduzir em segurança sob o efeito do álcool, imagine-se a fugir de um tigre-dentes-de-sabre ou apanhar um esquilo para o almoço! No entanto, afirma Nora Volkow, directora do NIDA e pioneira de visualização para compreender a dependência, “ o uso de drogas foi registado desde o início da civilização. Em minha opinião, os seres humanos vão sempre querer experimentar coisas que os façam sentir bem. As drogas de dependência afectam as mesmas funções cerebrais que permitem aos nossos antepassados distantes sobreviver num mundo hostil. A nossa mente está programada para prestar atenção especial ao que os neurologistas chamam de saliência.
As ameaças, por exemplo são altamente salientes, e é por isso que tentamos intuitivamente evitá-las. Mas o mesmo se passa com a alimentação e o sexo, porque ajudam o indivíduo e a espécie a sobreviver. As drogas de dependência aproveitam esta programação preexistente. Quando expostos às drogas, os nossos sistemas de memória, os circuito de recompensa, capacidades de tomada de decisão e de condicionamento entram em acção para criar um padrão de ânsia de consumo incontrolável. “Algumas pessoas têm uma predisposição genética para a dependência”, observa Volkow, “ mas visto que envolve estas funções cerebrais básicas, qualquer pessoa de tornará dependente, quanto suficientemente exposta a drogas ou álcool.































































Porque nos Viciamos?
Pode acontecer o mesmo com as dependências não químicas. Comportamentos como o jogo, as compras e o sexo podem deslizar para dependências. Por vezes, há uma raiz comportamental do problema. O grupo de investigação de Volkow, por exemplo, demonstrou que pessoas patologicamente obesas apresentam hiperactividade nas áreas do cérebro que processam os estímulos alimentares, incluindo boca lábios e língua.

Para elas, activar essas regiões e como abrir as comportas do centro do prazer. Mas quase tudo o que é profundamente agradável se pode transformar numa dependência. Claro que nem toda a gente se torna de pendente. Isso porque temos outras regiões mais analíticas que avaliam as consequenciais e suplantam a mera busca de prazer.
A visualização cerebral está a mostrar exactamente como isso acontece. Paulus, por exemplo estudou os dependentes de meta-anfetaminas inscritos num programa intensivo de reabilitação de quatro semanas. Os que apresentavam maior probabilidade de recaída no primeiro ano, após conclusão do programa, também eram menos capazes de completar tarefas envolvendo capacidades cognitivas e menos eficazes a adaptar-se a novas regras. O que sugere que esses sujeitos podiam também ser menos dados a usar as áreas analíticas do cérebro ao efectuarem tarefas de tomada de decisão.
Em boa verdade, as visualizações mostraram que havia níveis reduzidos de activação do córtex pré-frontal, onde o pensamento racional se pode sobrepor ao comportamento impulsivo. É impossível perceber se as drogas danificaram essas capacidades das pessoas que recaem – mais um efeito do que uma causa do abuso químico –, mas o facto do défice cognitivo só ter existido nalguns dos utilizadores da droga sugere a existência de alguma coisa inata que só era típica deles. Para sua surpresa, Paulus constatou que em 80% a 90%dos casos, conseguia prever com precisão quem iria recair no prazo de um ano só por olhar para as imagens cerebrais.
Outra área de concentração dos investigadores envolve o sistema de recompensa do cérebro, accionado em grande medida pela dopamina, um neurotransmissor. Os investigadores estão a estudar a família de receptores de dopamina que povoam os neurónios e se ligam ao composto. Alimentam a esperança de que, se conseguirmos atenuar o efeito do composto que transporta o sinal de prazer aliviamos a propensão para a droga.

Um travão eficaz?
Um grupo particulado de receptores da dopamina por exemplo, denominado D3, parece multiplicar-se na presença da cocaína, meta-anfetaminas e nicotina, possibilitando a entrada d emais droga para activar células nervosas. “Pensa-se que a densidade de receptores é um amplificador”, diz Frank Vocci, director de fármaco terapias no NIDA. “Bloquear [quimicamente] a D3 interrompe imensos efeitos da droga. É o melhor alvo da modelação é o melhor alvo na modelação do sistema da recompensa.”
Mas tal como há duas maneiras de abrandar um carro – aliviando o acelerador ou premindo o travão –, também há duas possibilidades de calar a dependência. Se os receptores da dopamina forem o acelerador, os sistemas inibidores do cérebro funcionam como travão. Nos dependentes, este circuito natural de contenção chamado GABA (Ácido Gama-aminbutírico), está defeituoso. Sem uma adequada verificação química das mensagens enviadas pelas drogas, o cérebro nunca se dá conta de que está saciado.
A vigabatrina, um tratamento contra epilepsia já comercializado em 60 países, é um promotor eficaz do GABA. Nos epilépticos, a vigabatrina suprime os neurónios motores superactivados que levam os músculos a contrair-se e a entrar em espasmo. Na esperança de que fomentar o GABA no cérebro dos dependentes os possa ajudar a controlar os seus desejos, duas empresas de Biotecnologia Americanas, a Ovation Pharmaceuticals e a Catalyst Pharmaceuticals, estão a estudar o efeito de um medicamento no uso de meta-anfetemina e de cocaína. Até agora, em animais, a vigabatrina impede a decomposição do GABA, de modo a poder ser armazenado mais composto inibidor na sua forma integral, nas células nervosas. Dessa maneira, pode ser segregada maior quantidade quando essas células são activadas por um impulso da droga. “Se funcionar, funcionará em todos os dependentes”, coclui Vocci.


Stress Hormonas e Género…
Outro alvo para o tratamento da dependência é a rede do stress.
Entre criaturas superiores, como nós, o stress também pode alterar o modo como o cérebro pensa, em particular o modo como encara as consequências das acções. Basta recordar-mos a última vez em que estivemos numa situação stressante – com medo, nervosos ou ameaçados. “ A parte do córtex pré-frontal envolvida no conhecimento deliberativo é desligada pelo stress”, explica Vocci. “E é ainda mais inibido nas pessoas que abusam das drogas”. Com o córtex pré-frontal menos reactivo, os dependentes ficam igualmente mais impulsivos.
As hormonas – do tipo masculino – feminino – também podem ter o seu papel. Certos estudos demonstraram que as mulheres são mais vulneráveis ao desejo de nicotina na parte final do ciclo menstrual, quando são segregadas as hormonas progesterona e estrogénio. “O sistema de recompensa do cérebro tem diferentes sensibilidades em diferentes pontos do ciclo”, refere Volkow. “Existe maior ânsia durante esta última fase.”


O MECANISMO DA DEPENDÊNCIA:





















































1.Sentimo-nos bem quando os neurónios da via de recompensa segregam um neurotransmissor chamado dopamina para o núcleo accumbens e outras áreas do cérebro


2. Os neurónios da via da recompensa comunicam enviando snais eléctricos pelos seus axónios. O sinal passa para o neurónio seguinte através de um pequeno espaço vazio chamado sinapse.


3. É segregada dopamina para a sinapse, passando para o próximo neurónio e ligando-se a receptores, o que provoca um lampejo de prazer. O excesso de dopamina é reabsorvido pelo neurónio emissor. Outras células nervosas segregam GABA, um neurotransmissor inibidor que impede a sobreestimulação do nervo receptor.


4. As substâncias viciantes aumentam a quantidade de dopamina na sinapse, acentuandi a sensação de prazer. A depedênca ocrre qunado o uso repetido perturba o equilíbrio norma dos circuitos cerebrais que controlam a recompensa, a memória e o conhecimento, acabando por conduzir ao uso compulsivo da droga.

Adaptado do artigo «A CIÊNCIA DA DEPENDÊNCIA» por Michael D.Lemonick e Alice Park, in Visão nº 780

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